20/06/2021 16h17
Foto: reprodução

O capitão Angelo Capurro começou a manifestar sintomas de Covid-19 no segundo dia no mar. Dentro de cinco dias, o comandante de 61 anos ficou confinado na cabine, incapaz de sair da cama.Seis dias depois, ele morreu — deixando o navio cargueiro MV Ital Libera sem um timoneiro, carregando um cadáver que a tripulação não tinha como armazenar e com um possível surto de Covid a bordo.

Por seis semanas, a embarcação com bandeira italiana ficou na costa da capital da Indonésia, Jakarta, sem conseguir encontrar um porto que aceitasse um cadáver durante a pandemia, apesar dos pedidos repetidos por assistência.

Finalmente, neste mês, o corpo do capitão foi retornado ao país natal dele, a Itália, onde a família enlutada está buscando respostas sobre a morte e o tratamento dele no mar, em um caso que novamente direcionou os holofotes para as condições dos navegantes durante a pandemia.

Recuperar o corpo, porém, pode não fornecer as respostas que a família espera. Não havia lugar adequado para manter um cadáver no Ital Libera, o que significa que o corpo de Capurro ficou numa sala de armazenamento por seis semanas.

“Sem entrar em detalhes, todos sabemos qual era o estado que encontramos”, disse a advogada da família, Rafaella Lorgna. “Não sei nem se poderemos fazer uma autópsia.”

Morte

O capitão começou a exibir sintomas de Covid-19 em 2 de abril. Ele estava tossindo sem parar e com dores musculares e no peito, além de falta de ar, segundo familiares, que ficaram preocupados. Em e-mails, ele se tornava mais errático e incoerente a cada dia, segundo a família; no telefone, as palavras eram pontuadas pela tosse quando ele ligava a milhares de quilômetros de distância.

Em 7 de abril, ele estava acamado na cabine dele, segundo a família. Um marinheiro recebeu a tarefa de levar comida e remédios a ele. Como capitão do navio, Capurro também era o atendente médico, então não havia mais ninguém para ajudar. Capurro se automedicou com um antitérmico e até encontrou oxigênio suplementar no navio, conta a família.

Percebendo que a saúde dele estava deteriorando, a esposa, Mollard, diz ter contatado a empresa proprietária do navio, Italia Marittima, uma divisão da Marinha Evergreen, de Taiwan, e exigiu cuidados médicos e, se necessário, que o capitão fosse desembarcado para tratamento no hospital mais próximo. O pedido dela foi recusado, ela diz.

Em 11 de abril, Capurro fez um teste rápido de Covid que deu negativo, de acordo com Mollard. Sem se deixar convencer pelo resultado, ela ligou de novo para a operadora do navio –dessa vez, insistindo para que o marido fosse desembarcado. Mas o pedido dela não foi respondido.

Um dia depois, Capurro ligou para o filho de 38 anos, também chamado Angelo. Arfando, ele disse: “Te liguei porque sua mãe me disse que você está muito preocupado”, lembra o filho. Angelo Capurro mentiu, para não causar nenhum estresse ao pai. “Não se preocupe, não estou preocupado, pai. Eu confio em você”, disse. Na manhã seguinte, Capurro morreu.


CNN Brasil