Operação Placebo: PF chega para cumprir mandado de busca e apreensão no Palácio Laranjeiras, residência oficial de Wilson Witzel, governador afastado por 180 dias pelo Superior Tribunal de Justiça | Foto: Domingos Peixoto em 26-5-2020 / Agência O GloboNas últimas décadas, foram inúmeros os escândalos no estado que levaram para a cadeia governadores, deputados e até conselheiros do Tribunal de Contas do Estado (TCE), que deveriam zelar pelo dinheiro público. Levantamento feito pelo O Globo em publicações e junto a órgãos de controle identificou que esquemas de propinodutos movimentaram, segundo denúncias, mais de R$ 6,1 bilhões desde 1999 em superfaturamento, pagamentos irregulares e lavagem de dinheiro envolvendo autoridades. O céu é o limite se a esse valor fossem acrescentados desvios de prefeituras e da União no Rio.

Com o dinheiro desviado seria possível acabar a Estação Gávea do metrô da Linha 4 (General Osório-Barra), estimada em R$ 1 bilhão, executar o projeto de reurbanização da Rocinha anunciado pelo governador afastado Wilson Witzel (R$ 1,5 bilhão), tirar do papel o projeto da Cedae de universalizar o saneamento básico da Baixada de Jacarepaguá, incluindo todas as favelas (R$ 2 bilhões), e até despoluir o Rio Guandu (R$ 1,4 bilhão).

Mas o diretor-executivo do Instituto de Estudos do Trabalho e Sociedade (Iets), Manuel Thedim, destaca que os prejuízos vão muito além do custo corrupção. São como uma bola de neve.

— A parcela de corrupção existente em um contrato gera dependência do contratante com o contratado. Se fizer exigências, poderá não receber a propina. Pode haver mudança de projeto e prejuízo na qualidade da execução — analisa Thedim.

O economista esperava que, ao longo dos anos, com as denúncias e prisões, a situação melhorasse. No entanto, Wilson Witzel, que assumiu há um ano e meio, é mais um a ser investigado.

— Parece que as pessoas perderam a vergonha — afirma ele. — Não há desenvolvimento sem instituições fortes. Quem quer investir num estado governado por corruptos?

O levantamento do GLOBO começou em 1999, quando Anthony Garotinho governava o Rio e Rodrigo Silveirinha era subsecretário-adjunto de Administração Tributária. Em 2003, estourou o escândalo do propinoduto, envolvendo quatro funcionários do governo, entre eles Silveirinha, e quatro auditores da Receita Federal, acusados de lavagem de dinheiro e remessa ilegal de dólares.

Ainda em 2003, a Justiça Federal do Rio condenou 22 réus do propinoduto. Silveirinha recebeu pena de 15 anos e cinco meses de prisão, mas, no ano seguinte, foi solto por um habeas corpus do Supremo Tribunal Federal. Desde então, o caso se arrasta na Justiça. Em março de 2018, Silveirinha foi flagrado dirigindo um táxi.

Dos cinco governadores que assumiram desde 1999 — sem contar os vices que ocuparam o cargo —, apenas Wilson Witzel não foi preso, mas foi afastado pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ) em 28 de agosto, suspeito de desvios na Saúde. Dos quatro presos, só Sérgio Cabral, investigado pela Lava-Jato do Rio, está atrás das grades desde 2016, e recebeu condenações que já somam 284 anos de prisão por organização criminosa, corrupção ativa e passiva, lavagem de dinheiro e fraudes em licitações. Preso no fim de 2018, Luiz Fernando Pezão foi solto pelo STJ em dezembro do ano passado. Ele usa tornozeleira e só pode sair de casa entre 6h e 20h.

Alvo do Ministério Público estado (MPRJ) e da Lava-Jato — força-tarefa que inclui Ministério Público Federal (MFP) e Polícia Federal —, as obras da Linha 4 do metrô foram as que deram maior prejuízo ao erário, com superfaturamento de R$ 2,6 bilhões, segundo o MPRJ, em valores atualizados. Os desvios na reforma do Maracanã para a Copa de 2014 também foram altos: R$ 300 milhões, em números de hoje. No PAC das favelas, chegou a pelo menos R$ 150 milhões.

Já as investigações da Lava-Jato/MPF — várias delas tratando de fatos apurados também pelo MPRJ — se concentram em propinas, evasão fiscal, lavagem de dinheiro e danos morais, não abordando o superfaturamento, explica a procuradora da República Fabiana Schneider. Uma das operações que miravam somas vultuosas foi a Unfair Play (para apurar a compra de votos para a escolha do Rio como sede da Olimpíada de 2016): danos materiais e morais de R$ 1 bilhão.

Outra operação da força-tarefa, em junho deste ano, a Favorito, que contabilizou um desvio de R$ 500 milhões em contratos fraudulentos na Saúde do estado com Organizações Sociais (OSs), trouxe um velho personagem à tona: o empresário Mário Peixoto, que, de acordo com procuradores, abocanharia recursos públicos desde a gestão de Cabral.

Com tantos casos de corrupção, o MPRJ lançou plataforma (Radar), em que é possível verificar o superfaturamento de contratos, investigados desde 2017, mas referentes a ocorridos a partir de 2005. Os dados são numéricos, sem especificar o caso em si, mas informam prejuízos em todas as esferas de governo. No estado, o superfaturamento de contratos soma R$ 3,35 bilhões.

O Globo